Arte-vida, arte-vômito: deglutição do real como totalidade. (Mário Jorge)

Sunday, May 10, 2009

Aforismo primeiro: a realteridade do pensamento.

O pensamento possui uma radicalidade fundamental. Força-se o pensamento a pensar na medida em que se mapeiam problemáticas. Estipula-se uma resposta que complementa pergunta quando se coloca em questão uma noção verdadeira, uma busca pelo verdadeiro. No entanto, um problema não complementa uma questão, ele simplesmente a destrói. Toda questão possui em si mesma a própria resposta. Porém, os problemas não existem no pensamento para serem solucionados, mas para serem pensados. Pensar os problemas significa criar, inventar, produzir. A tarefa da filosofia não é colocar os conceitos numa prateleira cujo objetivo seria fazer com que os aspirantes/pretendentes os retirassem no próprio ato de pensar. A filosofia é uma produção. Os conceitos são engendrados dos problemas. Enquanto as perguntas engravidam respostas que as complementam, os problemas engravidam conceitos que os pensam.

O que significa, portanto, pensar? Antes de mais nada, é preciso dizer o que nos impede de pensar. Cindindo o pensar em sujeito, objeto, ato, processo, forma e contexto ideológico, não se está pensando. Pensar não é uma ação de um sujeito cujo objetivo é o pensamento. Pensar não é uma virtude para poucos. Há vários mecanismos que nos impedem de pensar. Há várias máquinas cujo objetivo é somente esse: o platonismo e o positivismo. Há, no entanto, grandes máquinas de pensamento: a psicanálise e o marxismo. Máquinas que forçaram o pensamento a pensar sobre o desejo, sobre a história. Máquinas que produziram um corpo de desejo, atravessado por uma pulsão incessante, desvinculada do contexto instintivo (padronizado, estático, fixado em um objeto); produziram também um corpo da história, corpo-máquina de produção, corpo-fetiche do valor.

Pensar é, portanto, uma ação do corpo. Este não significa um substrato orgânico individual. Longe disso. Nunca se tem um corpo, sempre se constrói um corpo. Para aprender a andar de bicicleta é preciso não compreender como se carrega a bicicleta consigo, mas como se agencia um encontro corpo-bicicleta-pedalar. É quando a bicicleta está agenciada ao corpo, acoplada e não ao lado, que se aprende a produzir um devir-bicicleta. Dizer que pensar é uma ação do corpo significa afirmar que o pensar é uma potência. Pensar não se produz no estar parado. O pensar não é um agenciamento concentração-quietude-atenção. Pensar é um agenciamento encontro-afeto-produção.

Pensar não é algo que se dá naturalmente, não é algo que vem de cima. O pensamento é imanente. O pensamento é o real, na medida em que produz uma outra realidade. Não uma outra realidade acima ou abaixo, mais um real simplesmente. Intitular a filosofia de produtiva e não de representativa é produzir um real filosófico imanente. Os conceitos servem para maquinar o pensamento e não para adequá-lo ao pressuposto índice de verdade.

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